PRA-JA

Jardo Muekalia: Entre o Passado e o Futuro

Dr. Aníbal Simões (Escritor e professor universitário)

A política angolana tem sido marcada por homens que, provenientes da luta armada, procuraram reinventar-se no contexto da democracia. Entre essas figuras conta-se Jardo Muekalia, histórico militante da UNITA e homem de confiança de Jonas Savimbi, que mais recentemente aderiu ao projecto PRA-JA Servir Angola, de Abel Chivukuvuku. A sua trajectória pessoal e política ilustra de forma exemplar a tensão entre a memória e a mudança, entre a fidelidade ao passado e a exigência do futuro.

Jardo Muekalia nasceu a 20 de setembro de 1959, na província do Huambo, mais concretamente na aldeia da Citalela, no município do Mungo. Frequentou o ensino primário nos centros evangélicos do Zoar e na missão do Bailundo. Aos 16 anos, aderiu à UNITA. A expressão, por ele utilizada em como "trocou a guitarra pela metralhadora" ilustra a transição da adolescência para a participação nos combates da guerrilha. Fez formação militar em Rabat, no Marrocos, no início da sua carreira na luta armada. Ingressou na missão externa da UNITA em 1983, onde se destacou como porta-voz e diplomata. Foi chefe da representação da UNITA em Londres e, posteriormente, ocupou o cargo de representante em Washington, função que exerceu durante cerca de uma década (1989–1999).

É mestre em Relações Internacionais, grau obtido no Institute of World Politics, em Washington, tendo lecionado nessa disciplina.

É reformado das Forças Armadas Angolanas, com a patente de brigadeiro.

Ao longo da sua ação diplomática, esteve envolvido em negociações de paz em Abidjan e Lusaka e participou em todas as cimeiras realizadas entre Eduardo dos Santos e Jonas Savimbi no estrangeiro.

Autor do livro "Angola: A Segunda Revolução (Memórias da Luta pela Democracia)", Muekalia partilha memórias pessoais da sua juventude, a sua adesão ao movimento, as negociações políticas e a trajectória da UNITA. O próprio autor reconhece que a obra "não pretende ser história absoluta", mas sim uma narrativa da sua experiência durante os anos de guerrilha e luta pela democracia.

Muekalia descreveu Jonas Savimbi como alguém que "amou Angola acima de tudo" e enfatizou o seu papel como "diplomata fino" que projetou Angola no cenário internacional. Recorda também ter sido um dos seus confidentes mais próximos e partilhado com ele momentos pessoais que hoje interpreta com uma certa ternura e complexidade.

Após a morte de Savimbi, manteve-se em silêncio político durante um período em que viveu nos Estados Unidos, continuando, no entanto, ativo na comunidade angolana da diáspora, onde colaborou e continua a colaborar para promover os valores culturais angolanos e fortalecer os laços da comunidade no estrangeiro.

A carreira de Muekalia na UNITA começou cedo, tendo-se destacado pela sua lealdade e capacidade de defender a causa em palcos internacionais. Como diplomata, foi a voz do movimento em várias capitais do mundo, transmitindo a visão de Savimbi com o objectivo de conquistar apoios externos. Nesse papel, consolidou a sua reputação como um elemento respeitado e firme, capaz de dialogar com diferentes sensibilidades políticas. A sua obra "Angola: Segunda Revolução" revela também uma faceta intelectual, na qual sistematiza as ideias da UNITA e justifica o sentido da luta armada como caminho de transformação política e social.

No entanto, a história de Muekalia também foi marcada pela dor. Na Jamba, testemunhou de perto o preço humano da guerra. Entre as perdas mais sentidas, esteve a de Tito Chingunji, um amigo e colega próximo, cuja morte o deixou profundamente abalado. O desalento resultante marcou a sua memória e contribuiu para a sua consciencialização de que a guerra, para além de ideais e discursos, era feita sobretudo de vidas interrompidas. Esse peso humano, aliado às transformações ocorridas após a morte de Savimbi em 2002, acabaria por o conduzir a um afastamento progressivo da vida partidária activa.

Radicado nos Estados Unidos da América, Muekalia entrou num longo silêncio político, talvez como forma de se distanciar das dores do passado. No entanto, o seu regresso à vida pública não passou despercebido. Ao lado de Abel Chivukuvuku, decidiu aderir ao PRA-JA Servir Angola, um projecto que procura renovar o espaço da oposição e apresentar-se como alternativa credível ao poder. Este gesto é visto por alguns como um acto de coragem e renovação, enquanto outros o consideram uma ruptura com a memória de fidelidades que marcaram a sua vida.

Embora o seu passado tenha sido coroado de dor e de sucesso, pois afirmou-se como um grande diplomata capaz de dialogar com figuras de peso mundial, como Ronald Reagan e George Bush pai, o seu presente poderá ser ensombrado pelos detratores da ala dura, que poderão considerá-lo um dissidente das fidelidades tradicionais. No entanto, o futuro permanece em aberto e poderá reservar surpresas, dado o potencial que Muekalia ainda possui. Como se tem dito, para projectar o futuro de um homem basta conhecer alguns  momentos altos do seu passado.

 

Fontes consultadas:

Muekali, Jardo. Angola: A Segunda Revolução – Memórias da Luta pela Democracia. Porto Editora, 2010.

VOA Português. “Acima de tudo, Savimbi amou Angola – Jardo Muekalia”. 2012.

VOA Português. “Jardo Muekalia publica livro sobre Angola”. 2010.

Embaixada de Angola nos EUA. “Embaixador Agostinho Van-Dúnem conversou com Jardo Muekalia”. 2022.

 

PRA-JA Jardo Mukalia. Angola
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